Procrastination
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Nenhum de nós poderá afirmar, com verdade, que nunca adiou alguma coisa que tinha para fazer. Possivelmente, olhamos para a nossa agenda e encontramos uma quantidade de coisas que já devíamos ter feito e se acumulam à espera de uns minutos de atenção e trabalho.
O que nos pode deixar desconfortáveis e com o sentimento de alguma incompetência. É então que nos passa pela cabeça a máxima "não deixes para amanhã o que podes fazer hoje", talvez mais como acusação do que como ajuda para ultrapassar a nossa procrastinação.
Procrastinar significa, etimologicamente, deixar para amanhã. Este adiamento de algo que temos para fazer traz consigo, muitas vezes, sentimentos de culpa, vergonha em relação aos outros, por não cumprimento com as responsabilidades e compromissos, e resulta em stress. O adiar sistemático, o desconforto que gera, assim como as suas consequências negativas, são problema para muitos profissionais. O problema começa a existir quando a procrastinação impede ou perturba o trabalho e traz resultados negativos, pela perda de produtividade, por afectar as relações ou elevar o stress para níveis já pouco suportáveis.
Hoje, temos todos demasiadas tarefas, projectos, afazeres, compromissos e actividades. Dar conta de tudo exige, possivelmente, que alguns sejam aligeirados, ignorados ou adiados. Acreditar que temos de ser sempre eficientes, ou que é assim que são os homens e mulheres de sucesso, pode ser mais uma forma de nos atormentarmos. Os estudos biográficos sobre pessoas famosas e de sucesso, em diferentes domínios, têm mostrado como todos eram procrastinadores, ou seja, para se dedicarem a um projecto maior frequentemente deixaram para trás outras partes das suas vidas ou actividades.
Dificuldades na superação da procrastinação
O maior problema no combate ao adiamento é que, qualquer que seja a solução proposta, e por muito que ela possa ser útil, pode tornar-se sempre em mais um motivo ou factor de adiamento. Veja-se o exemplo das listas de tarefas: fazê-las pode ser um bom meio para organizar os afazeres, projectos e tarefas e não deixar que fiquem esquecidos, mas pode também ser um bom pretexto para deixar para mais tarde aquilo que não apetece fazer agora. Fazer uma boa lista, completa, bem apresentada e formatada, pode ser um bom pretexto para não abordar qualquer das tarefas que contém.
O mesmo se pode dizer em relação a encontrar um lugar sem distracções ou qualquer outra regra bem intencionada que alguém nos terá sugerido para nos organizarmos melhor.
Não podemos substituir as receitas de fora, vindas dos outros, pela atenção às soluções de dentro. Se há coisa que a psicologia nos pode mostrar é que as nossas decisões e comportamentos são processos complexos, assentam sempre em dinamismos internos que não são lineares, mas conflituais.
A tentação de procurar ter a chave-mágica para nos tornarmos eficazes só aumenta um dos lados do conflito. As tentativas de nos organizarmos para fazer tudo o que temos para fazer mostram-nos, em primeiro lugar, que o nosso mundo interno precisa de estar organizado. O que não significa arrumado.
Muitas vezes, a sua desarrumação é tão grande que preferimos dar prioridade a arrumar o espaço externo: a casa, as gavetas, o escritório, assim tendo a sensação de estarmos melhor internamente.
Várias formas de adiar
A opção consciente ou inconsciente de adiar não é sempre da mesma natureza. Podemos individualizar algumas delas: Amadurecimento - Há coisas que precisamos de deixar amadurecer dentro de nós. Os profissionais que têm de tomar decisões importantes, ou os criativos, necessitam de deixar maturar a informação de que dispõem, ou ter um tempo para agregar mais informação.
Prioridade - As coisas que temos para fazer nunca têm todas a mesma importância. Atribuir-lhe e seguir uma lista de tarefas que as uniformiza pode ser uma maneira de nunca fazer o mais importante, pois se está demasiado ocupado. Fazer algumas coisas, nomeadamente grandes projectos que requerem dedicação, pode significar descurar tarefas simples ou menos prioritárias. O problema é importância e urgência confundirem-se muitas vezes.
Arrumação - Abordar uma tarefa pode requer arrumar outras que lhe são anteriores, exigindo trabalho prévio. Do mesmo modo, realizar algumas tarefas significa encerrar algo, que nos pode gerar alguma resistência ver acabado.
Evitamento - Adiar pode ser, também, uma maneira de evitar coisas ou situações que nos incomodam. Umas vezes na esperança que desapareçam, outras devido ao incómodo que nos trazem.
Por isso, ter alguma compreensão das razões e motivos que nos levam a adiar uma tarefa pode ser um movimento saudável para nos relacionarmos com ela. Abordagens sempre suspeitas podem ser sempre o "preciso de mais tempo", "preciso de me organizar" ou "preciso de ter as condições para o fazer".
Perceber a importância da tarefa, a sua prioridade e razão de ser podem ser pistas para compreendermos a nossa interacção com ela.
Para evitar a acumulação desnecessária de trabalho, alguns profissionais procuram, com bons resultados: Não ficar com trabalho para mais tarde - Os mais centralizadores e obsessivos tendem a ficar com o trabalho nas mãos: no final de uma reunião, ou do dia de trabalho, acumularam uma grande quantidade de tarefas para fazer mais tarde, com base apenas no seu trabalho.
Grande parte dessas tarefas não irão ser feitas. Outros, pelo contrário, têm a capacidade de não levar trabalho para casa, ou seja, conseguem que ele seja feito com os outros, no momento em que surge.
Delegar - Não acumular trabalho pode significar delegar responsabilidades e tarefas. Talvez colegas ou colaboradores o possam fazer, mesmo quando tendemos a achar que só nós o poderíamos fazer bem.
Trabalhar em equipa - Colocar o trabalho sobre a equipa, ou seja não ficar com ele nem ter de gerir a sua execução, pode ser útil em dois sentidos: não aumenta a quantidade de trabalho individual e permite que a própria equipa seja útil na programação da execução.
Ter tempo para pensar - Não ser dominado pela execução das tarefas é especialmente importante; ter tempo para respirar e para pensar tem de ser uma dimensão associada tanto à execução das tarefas como às atitudes acima referidas. O tempo gasto a pensar como não gastar tanto tempo pode ter resultados surpreendentes.
Como vencer a inércia?
Quando as tarefas e responsabilidades se acumulam, começa a ser difícil saber por onde pegar e não se consegue pegar por lado algum. Será que funcionam as pequenas dicas ?
Como dissemos, qualquer uma delas pode ser muito útil, mas também se pode tornar em mais um obstáculo.
1-A célebre lista - A vantagem da lista de tarefas a fazer é não deixar cair no esquecimento qualquer uma delas. Mas ela própria se pode tornar em factor de adiamento, pelo tempo que nos absorve, pelo peso que o seu tamanho coloca sobre nós, ou porque retira a dimensão motivacional, reduzindo a lista a um conjunto de coisas que, aparentemente têm igual valor.
2-As arrumações - A arrumação como tarefa prévia ao que há a fazer parece resultar bem para algumas pessoas. Constroem assim algum sentido de arrumação interna. Mas, também isso pode tornar-se apenas um bom motivo para adiar, até a casa estar limpa, o carro lavado, a secretária arrumada, a gaveta impecável e o computador organizado. Ou seja, nunca.
3-Mudar de ambiente - Procurar um ambiente com menos distracções, ou em que a presença de outros nos seja favorável, pode ser importante. Mas a procura do ambiente ideal, assim como das condições necessárias, pode ocupar-nos todo o tempo e ajudar a nunca fazermos a tarefa necessária.
4-Não ficar a patinar - É mais comum adiarmos interpondo outras coisas do que por insistência na mesma. No entanto, algumas vezes, quando nos obrigamos a tratar do item seguinte da lista, a insistência improdutiva, na mesma tarefa, pode ser uma perda de tempo. Alguns trabalham melhor com mais do que uma alternativa de tarefa, de natureza diferente, ao mesmo tempo, permitindo adequar a disposição do momento a cada uma delas.
5-Motivação - Interrogarmo-nos sobre qual a motivação para a tarefa, qual a importância do que estou a fazer e do que não estou a fazer pode ser importante para obter as prioridade certas.
6-Cortar - Será que temos de fazer tudo o que está na nossa agenda ? Há coisas que preciso mesmo de fazer ? Não as poderei delegar, partilhar ou simplesmente prescindir delas ? Todos os grandes sistemas que alimentam a ilusão de ser eficazes independentemente da acção do individuo tendem ao fracasso. E, com isso, a aumentar a sua angústia, já que com ele até a melhor e mais reputada orientação terá fracassado. Só o conhecimento de si mesmo e da natureza do seu dinamismo interno podem ajudar a encontrar boas soluções, criativas e adequadas, sem desprezar a experiência ou conselhos dos outros.
PS.
Este artigo foi entregue fora de prazo, pois o autor foi adiando...Talvez o leitor também se tenha servido dele para adiar qualquer outra coisa que precisava de fazer...
Por isso, a procrastinação não será resolvida com fórmulas fáceis, mas através de um conhecimento cada vez maior do nosso próprio funcionamento mental, cognitivo e emocional.
Vítor Franco
Fonte: Médicos de PortugalEtiquetas: medicina