A solenidade do Corpus Christi já era celebrada em Portugal no século XIII, desde o reinado de D. Afonso III. Era, à época, uma festa de adoração, não envolvendo a procissão pelas ruas.
O rito da procissão foi instituído pelo Papa João XXII (1317). Na igreja dos Mártires, em Lisboa, manteve-se, no decurso dos séculos (e apesar das inovações havidas), o rito da festa com exposição do Santíssimo, Procissão, Vésperas solenes e Sermão.
As Câmaras Municipais e as Corporações de Artes e Ofícios acolheram a devota iniciativa, pelo que, a breve trecho, a Procissão veio a tornar-se a mais vistosa e interessante de todas, merecendo o título de “Procissão das Procissões”.
Constituída por cortejo cívico e corporativo, com carros alegóricos, figuras pitorescas, danças, momices e cenas de autos sacramentais, a procissão demorava horas a caminhar, vindo a constituir tanto um evento religioso como um evento social.
As Câmaras, determinando instruções régias, publicaram Regimentos ou regulamentos da Procissão, indicando os usos e os costumes, os modos de vestir, as obrigações de cada Corporação, as danças (entre elas a judenga, ou dança dos judeus), as bandeiras e pendões, as coreografias (anjinhos, folias, figuras sacras...) e o lugar do Clero. Raras foram as sedes concelhias que não tiveram Regimento da Festa, mas as memórias mais expressivas acerca da Procissão ficaram em Coimbra, no Porto e em Lisboa.
Celebrada em Lisboa, a festa do Corpo de Deus incluiu a Procissão, pela primeira vez, em 1389. Eram os tempos da consolidação da autonomia face a Castela e do bom ambiente criado pelas vitórias bélicas de Nuno Álvares e da influência cultural britânica (a ponto de S. Jorge - devoção inglesa, vencedor do Mal, do Dragão - ser considerado Padroeiro de Portugal).
Por isso, à solenidade do Corpus Christi juntou-se a festa de S. Jorge. Desta junção, resultou a magnificência da Procissão da capital. A festa chegou a atingir surpreendente grandiosidade no tempo de D. João V, incorporando a Procissão incorporava, desde logo, as associações socioprofissionais e também as delegações das diversas Ordens Religiosas de Lisboa (Agostinhos, Beneditinos, Dominicanos, Franciscanos, Ordem de Cristo...) e militares. No cortejo, avultava a figura de S. Jorge a cavalo e a Serpe, ou dragão infernal (do tipo chinês, locomovido por figurantes), contra o qual S. Jorge lutava.
Havia paragens para representação das famas ou glórias de S. Jorge; e também para uma série de danças. Representavam-se ainda as tradicionais “estações” do Santíssimo, como hoje ainda se faz na procissão de Sevilha.
No final do cortejo, vinha o pálio, a cujas varas pegavam os mais altos dignitários da Corte e da Câmara, sempre representada por toda a Vereação. Sob o palio, deslocava-se o Bispo de Lisboa, ostentando a custódia com o Santíssimo Sacramento. Era ladeado pelo Rei, ou Chefe de Estado, ou dignitário similar.
Dado curioso a salientar é o da tentação de realização de atentados contra as figuras régias, durante a procissão do “Corpus Christi”. Um deles, contra a pessoa de D. João IV. Sobrevivendo o monarca ao acto, a sua esposa (D. Luísa de Gusmão) promoveu a construção do Convento dos Carmelitas, na Baixa Lisboeta. Edificado no exacto lugar do falhado crime, foi chamado do “Corpus Christi”. Outro atentado famoso deu-se contra D. Manuel II, perto da Igreja da Vitória, quando a procissão passava na rua do Ouro.
Mas a legislação de 1910, proibindo os dias santos da Igreja (excepto o Natal e o dia 1 de Janeiro), interrompeu o culto público, embora, nas igrejas, continuassem a ser celebradas missas solenes e solenes pontificiais nas Sés.
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