Foi a 28 de Fevereiro e estava-se em 1909. Dois anos depois, a 19 de Março, mais de um milhão de mulheres manifestaram-se nas ruas da Áustria, Dinamarca, Alemanha e Suíça, pelo direito de voto, pelo acesso à função pública e à formação profissional, e pelo fim à discriminação no trabalho.
Em 1917, as mulheres da Rússia protestaram pelo pão e pela paz, no último domingo de Fevereiro, o que representa o dia 8 de Março do calendário gregoriano, e ficou feita uma tradição que não mais parou, tal como o movimento internacional das mulheres.
Refira-se, a propósito, que a Carta das Nações Unidas, em 1945, foi o primeiro tratado internacional a proclamar o princípio da igualdade entre mulheres e homens. E isso constituiu um autêntico marco de referência para outros tratados, declarações, constituições nacionais.
O Dia Internacional das Mulheres deve, simultaneamente, servir de pausa e reflexão sobre o caminho percorrido, os resultados conseguidos, nesta luta de colocar termo a todas as formas de discriminação de que as mulheres são vítimas nesta sociedade patriarcal, de relações desiguais de poder, tal como deve servir para relançar programas, estratégias e acções que imprimam novas dinâmicas e novas acessibilidades a uma participação mais ativa e igualitária das mulheres num mundo ainda controlado pelos homens.
As quatro conferências já realizadas pelas Nações Unidas sobre estas questões assumiram um papel fundamental. Mas permita-se-nos distinguir, pelo impulso decisivo que teve, a Declaração de Pequim e a Plataforma de Acção, saídas da 4ª Conferência Mundial das Mulheres, realizada em 1995.
Foi um momento glorioso. 189 governos. 4.000 Organizações Não Governamentais. 4.000 jornalistas. 40.000 participantes.
As suas conclusões constituíram uma autêntica agenda para o empoderamento das mulheres, que ainda hoje ilumina os nossos passos, e a primeira consagração do conceito de igualdade de género.
Ali se destaparam duras realidades. São as mulheres as mais afetadas pela pobreza e as mais discriminadas no acesso à educação e à formação e aos cuidados de saúde.
A violência contra as mulheres não conhece fronteiras geográficas, nem sociais, dentro e fora das portas conjugais, e ultrapassa ainda hoje todas as mais elementares regras do bom senso. Falar de violação de direitos humanos é falar de violação dos direitos das mulheres.
São estas as mais afetadas em conflitos militares, ou pelos estereótipos sexistas e moralistas como a comunicação social as trata.
A partilha do poder continua desigual, pesem embora as leis das paridades que aqui e acolá têm sido adoptadas. Não só na política, mas na economia, no desporto, na cultura, no social ou no educacional, os homens continuam a dominar.
Quantas mulheres são presidentes de clubes de futebol, reitoras de universidades, presidentes de multinacionais ou associações empresariais?
Os horários da política e da estrutura económica estão feitos a pensar que o lugar das mulheres é em casa, metidas nas cozinhas.
foi feito e tanto resta ainda por fazer. Neste Dia Internacional da Mulher, será bom pensar Pequim quinze anos depois e tomar consciência dos diferenciais que urge reduzir a pó: nos salários de trabalho igual, na diferença entre as medidas já tomadas e as medidas de facto implementadas em favor da valorização das mulheres, na situação delicada das mulheres migrantes ou pertencendo a grupos e etnias minoritárias, na falta de dados estatísticos desagregados por indicadores sensíveis às questões de género.
O combate à violência contra as mulheres, onde se inclui a violência doméstica, constitui actualmente uma das principais preocupações do Conselho da Europa, estando em curso a elaboração de uma Convenção que colocará o acento tónico na prevenção do fenómeno, do apoio às vítimas, da perseguição aos agressores, e em políticas integradas de igualdade.
Há que legislar, mas tão importante é monitorizar a aplicação das leis. Há que caminhar para uma sociedade mais justa, mais equilibrada, sem medos nem receios do empoderamento das mulheres.
As mulheres ao poder e o poder às mulheres são duas faces de uma mesma moeda, que assenta na trave mestra dos Direitos Humanos, inalienáveis e indelegáveis. Já não estamos apenas no tempo do humanitário, mas do humanismo. Tampouco deveremos ficar pela vitimização.
Há uma nova ordem para a humanidade, que está aí à porta. É uma nova ordem de género. Quem não está preparado, será bom que se habitue. Nada será como dantes. Acredita-se que será para melhor.
*Presidente da Comissão para a Igualdade de Oportunidades entre Mulheres e Homens da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa.
8 de Março de 2010 09:22
José Mendes Bota*
Fonte: BarlaventoEtiquetas: Dia Internacional, mulher